O ex-ditador guatemalteco Efraín Ríos Montt, de 86 anos, foi declarado culpado de genocídio, nesta sexta-feira (10), em histórico julgamento, e se tornou o primeiro líder latino-americano e um dos poucos no mundo a ser condenado por esse crime.
“Os atos de José Efraín Ríos Montt se enquadram em genocídio (…) A pena correspondente deve ser imposta”, anunciou a juíza Jazmín Barrios, titular do Tribunal Primeiro A de Maior Risco, ao ler o veredito, ao qual ainda cabe recurso.
Ríos Montt foi condenado a 50 anos de prisão por genocídio e mais 30 anos por outros crimes contra a humanidade.
Presente na audiência, Ríos Montt reagiu com aparente indiferença ao anúncio. A juíza também determinou a revogação da prisão domiciliar do réu e seu ingresso em um presídio.
Durante o julgamento, o militar negou os fatos: “eu me declaro inocente, nunca tive a intenção, o propósito de destruir nenhuma etnia nacional (…). Não sou genocida”.
Ele qualificou de “show político internacional” sua condenação e anunciou que apelará da sentença.
“É um show político internacional que vai afetar a alma do povo guatemalteco, mas estamos em paz porque jamais derramamos ou manchamos as mãos com o sangue dos nossos irmãos”, disse Ríos Montt em sua primeira reação à sentença, em meio à euforia dos familiares das vítimas dos massacres.
O genocídio é o crime mais grave reconhecido pelo Direito Internacional, mas, ainda assim, um dos mais difíceis de provar.
O de Ruanda (1994), a matança de Srebrenica em 1995, durante a guerra da Iugoslávia, e as atrocidades do regime khmer do Camboja (1975-1979) se traduziram em julgamentos para alguns dos envolvidos, mas não em condenações às autoridades máximas desses países.
Longo caminho
Foi preciso um longo caminho para que o ex-ditador fosse condenado. Confira abaixo a cronologia:
De 1982 a 2011 – 23 de março de 1982: Chega ao poder após um Golpe de Estado contra o general Romeo Lucas García. Seu regime aplica a chamada política de ‘terra arrasada’ nas comunidades indígenas acusadas pelo Exército de apoiar a guerrilha.
– 8 de agosto de 1983: É derrubado por seu ministro da Defesa, Óscar Mejía Víctores.
– 1989: Funda a Frente Republicana Guatemalteca (FRG, direita), que chega à presidência em 2000 com Alfonso Portillo, atualmente preso e cuja extradição é requerida pelos Estados Unidos por lavagem de dinheiro.
– 1994 a 2004: É deputado em três legislaturas.
– 2000 a 2004: Preside o Congresso durante o governo da FRG.
– 6 de junho de 2001: Familiares de vítimas da guerra o acusam judicialmente de genocídio pela morte de 1.771 indígenas mayas-ixiles em Quiché (norte), mas é protegido pela imunidade parlamentar.
– 2003: É inscrito como candidato da FRG, apesar de a Constituição proibir golpistas de se candidatar à presidência. Fica em terceiro lugar.
– 2008: Assume novamente como deputado.
– 2011: Uma juíza tipifica como crime de genocídio o massacre de 201 camponeses na aldeia Dos Erres e o acusa formalmente.
2012 – 14 de janeiro: Termina seu período como deputado e perde a imunidade parlamentar.
– 26 de janeiro: Se apresenta à Justiça voluntariamente e passa à prisão domiciliar.
– 1 de março: Justiça rejeita recurso baseado na lei de anistia de 1986, por não se aplicar a genocídio.
– 22 de maio: Aberto segundo processo judicial por genocídio pelo massacre de Dos Erres.
– 12 de novembro: Rejeitado outro recurso baseado na lei de anistia.
2013 – 28 de janeiro: Admitido julgamento por genocídio pelo massacre dos mayas-ixiles.
– 19 de março: Iniciado julgamento no Tribunal Primeiro de Maior Risco A, a cargo da juíza Jazmín Barrios.
– 18 de abril: Julgamento suspenso por recursos pendentes.
– 30 de abril: Retomado julgamento, que em 8 de maio entra na fase de conclusões.
– 9 de maio: Ríos Montt fala pela primeira vez para negar que tenha cometido genocídio.
– 10 de maio: É condenado a 50 anos de prisão por genocídio e a 30 anos por outros crimes contra a humanidade. Revogada a prisão domiciliar.