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OPINIãO DO LEITOR

Rua 24 de Outubro

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Foi Edward Bernays que cunhou a frase: “Se entendermos os mecanismos e as motivações da mente de grupo, é possível controlar e reger as massas de acordo com a nossa vontade, sem seu conhecimento”.

Conversar com pessoas estranhas é sempre muito interessante, além de uma forma de termos encontros significativos e simbólicos, que certamente alterarão a nossa forma de ser e agir. Eu, por exemplo, tenho o “estranho costume” de conversar com as pessoas que eu não conheço. Converso durante a caminhada, no ponto de ônibus, no shopping, balada, motel, velório e cemitério. Geralmente eu início a conversa, mas em raras exceções, por incrível que pareça, o objeto de cobiça para um bate papo sou eu. Talvez porque eu seja um dos poucos jovens que geralmente não estão em locais de uso comum conectado à internet através de smartphones, com fone de ouvido escutando as mais belas canções já compostas pela raça humana. Estas que atualmente não saem das listas das mais tocadas – pelo belzebu, talvez. É que nestes casos prefiro estar conectado ao mundo real que ao virtual. Afinal, é no mundo real que o melhor da vida acontece.

Pois bem, outro dia conheci Francisco. Fala mansa, olhar profundo, mãos calejadas… um típico brasileiro que deixou a sua família em algum lugar do sertão e acabou se perdendo (ou se encontrando) na procura do “sonho brasileiro”. Chico, como prefere ser chamado, contou que há alguns anos está morando em Cuiabá, mas já deu a volta ao mundo. “Fui ao Haiti, Japão, China, Austrália, Estados Unidos, Mongólia, Alasca, Nepal… e recentemente voltei da França; Adorei Paris!”. E então Chico me contou diversas histórias dos locais por onde já passou. “Certa vez eu estava no The Peak – em Hong Kong – quando vi uma senhora de cócoras lendo um livro. Ela devia ter uns 60 anos e me impressionou com tamanha disposição e resistência. Em Nova York fui assistir a uma partida de hóquei sobre o gelo. Fiquei pasmo com a violência do esporte e com o delírio do público. Todos sedentos por mais e mais violência, que eles teimam em chamar de ‘esporte’. Na Austrália eu estava no Uluru – que é o maior monolito de pedra do mundo e um local sagrado para os Aborígenes – quando encontrei um grupo de brasileiros. Numa rápida conversa descobrimos que tínhamos muitas coisas em comum e acabamos nos ajudando com informações sobre locais interessantes para se visitar, comer, beber, etc. Brasileiro é assim quando se encontra no exterior. Quando está no Brasil a coisa é um pouco diferente…”

Enquanto Chico contava as suas histórias foi se empolgando, e àquele brilho no olhar de quem recebe um pouco de atenção de um estranho foi se revelando cada vez mais intenso. Ao mesmo tempo, sem que Chico percebesse, algumas pessoas se aproximaram para ouvir as histórias do invisível que passará a ser visível. Em determinado momento, quando Chico contava sobre um passei de balão na Turquia, uma senhora interrompeu a história dizendo que havia visto esses balões na novela e tinha achado muito bonito. “Meu sonho é andar num balão desses. É como se assim eu ficasse mais perto de Deus”. Disse a senhora, com o olhar esperançoso e triste de quem dificilmente realizará o seu sonho.

No momento em que o mundo se revelou atento as suas história e ele se viu no centro das atenções, o homem surtou. Como quem “cutuca onça com vara curta”, Chico saiu correndo e desapareceu entre as almas perdidas e encontradas da Rua 24 de outubro. Talvez tenha ido atrás de uma nova plateia, talvez tenha ido para o Japão, talvez, talvez, talvez… Talvez o invisível não tenha suportado a dor de ser visível num mundo de invisíveis. O fato é que eu nunca saberei se eu fui manipulado e se essa história é verdade ou não. E provavelmente nem você. Afinal, como já dizia Edward Bernays: “Se entendermos os mecanismos e as motivações da mente de grupo, é possível controlar e reger as massas de acordo com a nossa vontade, sem seu conhecimento”. Pois… Zé!

Edilberto Magalhães

Turismólogo, Produtor Cultural e Servidor Público da Sema-MT

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