As pernas se acostumaram com cada movimento da marcha atlética. O corpo de Caio Bonfim também se acostumou com as rotinas duras de treino. Ao longo dos últimos anos, ele vem trabalhando duro, progredindo e subindo degrau por degrau para chegar no melhor nível nos Jogos Olímpicos de 2016. Já garantido no Mundial de Pequim, em agosto, o atleta de Brasília embarcou nesta quarta-feira para um período intenso de competições e treinamentos na Europa. Como de costume, viajará ao lado dos técnicos e pais, Gianetti e João Senna.
– É importante a experiência de estar em provas na Europa. Saber como estão os adversários. Cada prova são com atletas de países diferentes. Você vai vendo várias marchas, de vários lugares e pessoas diferentes – disse o atleta, que ficará 38 dias em solo europeu.
Nas próximas semanas, Caio participará de quatro competições na Suíça, Eslováquia, República Tcheca e Portugal, onde também fará um período de treinamento com a consultoria de um técnico local. Nesses eventos, ele terá a oportunidade de enfrentar rivais de alto nível e adversários do Mundial.
Caso dos russos
No começo deste ano, a marcha atlética sofreu um baque. Cinco atletas russos da prova, incluindo três campeões olímpicos, foram banidos pela Agência Antidoping Russa. Suspensões de três anos e dois meses foram anunciadas a Sergei Kirdyapkin, ouro nos Jogos de Londres 2012 e bicampeão mundial da prova de 50km; e para Olga Kaniskina, campeã olímpica em Pequim 2008, prata em Londres e tricampeã mundial da distância de 20km. Medalha de ouro na China e bicampeã mundial, Valery Borchin foi flagrada pela segunda vez e acabou punida com oito anos de suspensão pela reincidência. A Rússia vive uma crise desde o fim do ano passado, quando a imprensa europeia denunciou vários casos de doping e corrupção no atletismo russo.
Líder do ranking brasileiro dos 20km, Caio aprovou cada uma das medidas. Para ele, as acusações, seguidas de punições, são a melhor forma de limpar o esporte. Lembrou de certo domínio recente dos russos e classificou esse tipo de doping como falta de caráter.
– A gente, como atleta, fica feliz quando isso acontece. A gente trabalha tão duro, tão duro, e todo ano tem um russo diferente. No meio da prova, o treinador assobia, manda ir (mais rápido), ele vai e ganha a prova. A gente pensava: ”Isso não é normal”. Por um lado, a gente fica muito feliz com isso, porque fica mais justo o esporte. Não ficamos tristes porque manchou. Porque todo esporte tem mau-caráter. A gente fica é feliz porque vai eliminando essas pessoas, melhorando o nível dos atletas e fica mais justo. Que peguem mais. Se não tivesse pegando que era ruim. A gente não tem medo de manchar. É ruim essa conspiração, mas entre os atletas, se estão sendo pegos, porque aí a competitividade vai ficando justo e quem está limpo pode aparecer mais. É isso que a gente quer – disse o atleta brasileiro.
Caio Bonfim iniciou sua trajetória na marcha atlética profissional aos 16 anos. Apesar dos laços familiares com a prova, ele praticou futebol por 10 anos, jogando em clubes de Brasília. Antes de se aventurar como atleta, no entanto, enfrentou talvez seu adversário mais difícil.
– Quando comecei a andar, minhas pernas começaram a entortar. Os médicos não sabiam o que fazer e talvez teria que fazer cirurgia. No final, com dois anos e oito meses, fizeram cirurgia. Achavam que ia entortar de novo e nunca entortou. Os médicos sempre ficam impressionados que deu tudo certo. O médico fala que já fez cirurgia em pacientes que viraram atletas, mas paralímpicos. Olímpicos não – lembra.
A primeira prova de Caio foi neste sábado. O brasiliense garantiu o quarto título consecutivo dos 20km na Copa Brasil de Marcha, superando o forte calor de Blumenau. Ele completou percurso em 1h29min17s. Ele conquistou o índice para Pequim ainda no ano passado, com a marca de 1h20min28s obtida no Mundial de Marcha, também na China. Ele pretende disputar também os Jogos Pan-Americanos de Toronto, em julho.
sobre a marcha atlética
Em uma corrida de marcha atlética, os atletas são obrigados a ficar todo tempo com pelo menos um dos pés encostados no chão, o que faz com que eles tenham que correr balançando o quadril.
O percurso da Copa do Mundo tem 20km, e oito árbitros ficam espalhados para punir os atletas que desobedecerem as regras. Aquele que receber três cartões é automaticamente excluído da prova.
Um detalhe importante é que os árbitros não podem usar câmeras, têm que enxergar a olho nu se os atletas tiram os dois pés ao mesmo tempo do chão, o que é chamado de flutuação. Cada juiz só pode punir uma vez cada atleta, mesmo se o enxergar duas vezes cometendo a infração.