Em um ginásio lotado, olhares atentos miram o octógono. No pequeno espaço, o lutador de MMA Ricardo Sattelmayer, 35 anos, movimenta-se concentrado no rival. Troca chutes e socos. Em alguns minutos, leva o oponente ao chão. É nocaute! Vibração na arquibancada e no ringue. O octógono, nesse momento, é invadido pelas duas treinadoras do lutador. Ali, no centro das atenções e diante dos olhares de todos, Ricardo dá um beijo em cada uma.
Um beijo na boca de cada uma. A cena pode causar espanto em alguns, mas para eles não. Já faz parte do dia a dia. Há pouco mais de um ano, Ricardo vive junto com as duas e as tem como esposas.
Aline Sattelmayer, de 26 anos, e Bianca Sattelmayer, de 21, carregam o sobrenome de Ricardo informalmente. Mas o trio de São José dos Campos, interior de São Paulo, vai entrar com uma ação na Justiça para tentar legalizar essa união a três. O casamento no cartório entre um homem e duas mulheres não permitido é no Brasil. O que pode ser aceito é uma união estável poliafetiva, como uma reconhecida no ano passado, no Rio de Janeiro.
– Vamos tentar casamento no cartório. Sei que há um caso no Rio de Janeiro de um homem que se casou com duas mulheres. Acredito que não há nada de errado nisso. O que queremos é o bem-estar de uma forma legalizada com nosso estado, com nosso país, podendo registrar isso. Às vezes, o cara tem mulher e tem 10 amantes. Isso eu acho que é errado. Eu queria ter duas mulheres, convenci as duas – explicou Ricardo Sattelmayer.
O trio sabe que o caso é difícil. Uma cerimônia religiosa, então, enxergam como muito improvável. Uma alternativa que eles cogitam é sacramentar essa união em um evento no Havaí, onde eles dizem ser permitido isso.
Para o especialista em direito familiar e professor universitário, José Carlos Ortiz Abrahão, o caso não será aceito pela Justiça.
– Impossível segundo a legislação brasileira. Casar é com apenas uma pessoa. Se casa com uma, o outro casamento é nulo. Na lei, o casamento é uma vez só. O nosso sistema é monogâmico. Não há bigamia. (…) Mesmo se eles casarem no Havaí, o casamento não será coberto pelas leis aqui no Brasil – afirmou.
CASAMENTO A TRÊS
O MMA (mixed marcial arts, ou Artes Marciais Mistas em português) foi o que uniu os três. Primeiramente, a luta uniu Ricardo e Aline. Dono de uma academia no município paulista, Ricardo foi técnico de Aline. Dali, surgiu um relacionamento que já dura dez anos. Há seis, eles tiveram uma filha. E há um ano e dois meses, Bianca, que também chegou à academia como aluna, passou a fazer parte da família.
Ricardo conta que sempre teve vontade de ter duas esposas, mas com o consentimento das parceiras. Após convencer Aline da ideia, viu em Bianca uma segunda esposa ideal. Acreditava que a jovem tinha pensamento semelhante e, por ter uma amizade com o casal, poderia topar o convite. E após um susto inicial, ela realmente topou.
– A Aline disse que se eu não deixasse ela de lado e conseguisse dar atenção para as duas, ela toparia. Sentei com a Bianca e joguei direto para ela: “Queria ter duas esposas e você é uma mulher bacana, uma mulher que tem o mesmo objetivo que eu e a Aline. O que você acha?” A primeira coisa que ouvi foi: “Mestre, você está maluco”. Mas ela riu, achou engraçado. As duas entraram em consenso de que aceitariam. Desde então, estamos convivendo, muito felizes. O que nos traz muita satisfação no nosso relacionamento é gostarmos do que fazemos – disse Ricardo.
O trio diz que tem uma relação saudável e não há ciúmes entre eles. Convivem diariamente na academia, onde dão aulas e se preparam para as competições.