As vendas de zolpidem, um poderoso medicamento para dormir, cresceram 560% entre 2011 e 2018 no Brasil, país com 73 milhões de pessoas que sofrem de insônia, segundo a Associação Brasileira do Sono.
Foram compradas 11,4 milhões de caixas de zolpidem no ano passado, um recorde.
Apenas de 2017 para 2018, a alta foi de 33,5%. Os dados são de um levantamento exclusivo feito pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
O zolpidem aparece como o terceiro medicamento mais vendido em 2018 no levantamento, que inclui oito drogas psicotrópicas.
O aumento do consumo do zolpidem ocorre em meio a uma queda de outros medicamentos tradicionalmente usados, incorretamente, por quem tem problemas para dormir: os benzodiazepínicos, ou ansiolíticos.
“Os benzodiazepínicos não são hipnóticos, não induzem ao sono. São relaxantes musculares, ansiolíticos, amnésicos e geram dependência”, explica a presidente da Associação Brasileira do Sono, a médica neurologista Andrea Bacelar.
Diretriz da AMB (Associação Médica Brasileira) alerta que “os benzodiazepínicos costumam perder o efeito sobre o sono ao longo do tempo, sendo ineficazes para o tratamento da insônia crônica, além de levar a alterações da arquitetura do sono”.
Chamados de Z-hipnóticos, medicamentos como o zolpidem surgiram nos anos de 1990 para tratar quadros de insônia, como uma alternativa aos benzodiazepínicos. A grande vantagem divulgada pelos fabricantes sempre foi o menor efeito rebote e o baixo risco de dependência.
O zolpidem foi criado na França em 1988 e ganhou notoriedade em meados da década de 1990, quando foi aprovado nos Estados Unidos com nome comercial de Ambien.
No Brasil, o medicamento tem a venda autorizada desde 2007, com nome de referência de Stilnox, produzido pelo laboratório Sanofi-Aventis.
O clonazepam, vendido sob o nome de referência Rivotril, é até hoje o medicamento mais consumido entre os ansiolíticos. Por ter como efeito colateral a sonolência, é usado de forma incorreta para pegar no sono.
Mas as vendas de clonazepam e outros ansiolíticos têm caído ano após ano desde 2015, enquanto as de zolpidem aumentam.
“Eu vejo uma migração quase que direta do clonazepam [benzodiazepínico] para o zolpidem. Isso é positivo por um lado, mas não significa dizer que a gente precise utilizar tanto zolpidem assim”, diz Andrea.
A médica da Associação Brasileira do Sono reforça que “o tratamento para insônia não é farmacológico”.
“O que chega para o especialista em medicina do sono são pessoas completamente dependentes, usando cinco, dez medicamentos por noite. Aí temos que tratar dois problemas: o que levou a insônia e a dependência.”
As terapias para insônia incluem acompanhamento psicológico e podem levar pelo menos dois meses para surtirem efeito. Na prática, o indivíduo vai precisar “reaprender a dormir”, explica a médica,
“Com a diminuição do abuso dessas substâncias, a pessoa vai ter tempo de sono e percepção de tempo de sono.”
Segundo Andrea, “o mais importante nos casos de insônia é não se automedicar”.
“Não pode ter aquilo de ‘eu vou tomar esse remédio aqui porque meu marido ou minha mãe tomam’, e muito menos o uso diferente daquilo que foi prescrito pelo médico.”