Com o avanço da tecnologia na educação e uma geração de nativos digitais, o debate sobre a necessidade de ensinar a letra cursiva – a velha e boa caligrafia – ganha corpo. Para a neurociência, o domínio da caligrafia traz diversos impactos para o cérebro, como aponta o estudo “High-performance brain-to-text communication via handwriting” (“Comunicação cérebro-texto de alto desempenho via escrita à mão”) publicado em março deste ano na revista científica britânica Nature. A pesquisa relata o desenvolvimento de um instrumento que permite recuperar a comunicação de pessoas que perderam sua capacidade de falar ou de se mover.
Ao mentalizar movimentos feitos com a escrita cursiva, o equipamento é capaz de decodificar a atividade neural e traduzi-la em texto em tempo real. O mais interessante é que caso o indivíduo lesionado domine apenas a escrita da letra de forma ou a digitação, o aparelho não conseguirá interpretar o seu esforço de escrita.
Conexões neurais
“A letra cursiva estimula o cérebro de uma forma que a digitação e a letra bastão não conseguem”, diz Janaína Spolidorio, especialista em neuroeducação. Segundo ela, a letra cursiva consegue melhorar as conexões neurais do cérebro das crianças. “Ela consegue desenvolver uma relação entre os hemisférios direito e esquerdo, aprimorando a atenção, a linguagem e a memória de trabalho”, completa.
A melhor retenção de informações é outro benefício da letra cursiva para as crianças apontado por Spolidorio. Após um pouco de prática, a letra cursiva pode ser uma forma ágil de escrever, mas não é tão rápida quanto a digitação, por exemplo. Dessa forma, o cérebro tem mais tempo de interpretar o conteúdo, o que garante uma maior compreensão do texto. “Escrever em letra cursiva promove a reflexão sobre o que está sendo escrito”, explica a especialista. Ela também pode contribuir para manter a linearidade do pensamento. “Ao usar a letra cursiva, as crianças registram o pensamento que vem à tona e, para que haja fluidez, elas precisam ser fluentes e eficientes, o que contribui para a concentração e o foco”, acrescenta Adriana Meneguelo, coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental I do Colégio Mary Ward, em São Paulo.
“Desde a primeira infância, a criança já deseja escrever”, aponta a educadora. Primeiramente, as crianças escrevem com a letra bastão, que é mais fácil de aprender. “Elas imitam os movimentos quando vêem o adulto escrevendo, fazem seus rabiscos e ‘lêem’ o próprio registro. Isso é fantástico porque ela já sabe que há uma situação comunicativa ali, naquela escrita descomprometida”, completa a educadora. Conforme forem crescendo, as crianças começam a explorar a letra cursiva.
No entanto, o ensino desta forma de escrita divide opiniões. Há aqueles que defendem que a letra cursiva é muito trabalhosa e pouco presente no dia a dia, já que os jornais e redes sociais adotam a letra de imprensa. Mas o argumento mais forte a favor é que o cérebro da criança é melhor trabalhado quando ela pratica a letra cursiva.