O desmatamento na floresta, destruição do Cerrado, escassez hídrica, uso de agrotóxicos e a fome que assola o estado campeão em produção de carne e grãos são os debates da Primeira Semana de Agroecologia de Mato Grosso. O objetivo é ir além dos problemas e apresentar caminhos de transição para um novo modelo de agricultura livre de veneno, desmatamento e que assegure soberania alimentar a todos. A proposta é fomentar a Agroecologia como um caminho para soluções.
Os debates envolvem pesquisadores, agricultores, ambientalistas de todo país que vão se reunir entre os dias 4 e 10 de outubro, durante o evento virtual para tratar do tema “O agro sem o veneno do agronegócio”. Os debates são gratuitos e serão transmitidos ao vivo no canal do YouTube (https://www.youtube.com/channel/UCc9MIKzlESwLeibwLQk7k9g) e nas páginas do Facebook das entidades parceiras do evento (lista no final).
A semana tem como objetivo sensibilizar a sociedade sobre os benefícios da agroecologia, da produção e do consumo de alimentos orgânicos. Serão desenvolvidas atividades educativas e culturais relacionadas à produção agroecológica e ao equilíbrio ambiental.
A Semana de Agroecologia conta com uma programação extensa de mesas de debate e palestras. Entre os convidados do evento participam Luiz Zarref, do Movimento Sem Terra (MST), o líder indígena Typju Myky, o teólogo, escritor, filósofo e professor universitário Leonardo Boff, e o pesquisador da Fiocruz e UFMT, Wanderlei Pignati.
Caminhos para enfrentar a fome que voltou a assolar a população também serão foco dos debates. “Falta prioridade dos governos para alocar recursos e atender a população que precisa. Também faltou um modelo de desenvolvimento econômico que dê oportunidade às pessoas de produzir, ter trabalho, renda e alimento nas mesas. O Caminho da Agroecologia além de ser socioambientalmente sustentável é lucrativo. É possível produzir com o conceito da agroecologia, gerando mais renda e riqueza que o agronegócio”, diz Lúdio Cabral, médico e deputado estadual de Mato Grosso, autor da Lei nº 11337/2021, que idealizou os debates.
FOME
Muitos representantes de organizações de base do terceiro setor também devem participar dos debates. “Os temas são aqueles que giram em torno da problemática do Estado, que importa em torno de 80 a 85% do alimento que consomem. É falso dizer que o Brasil alimenta o mundo enquanto a população passa fome, ou seja, a comida, por exemplo, o que se produz e que se consome na mesa do mato-grossense, vem de fora, exceto alguns alimentos como mamão, melão, banana, alguns alimentos que se produz aqui na agricultura familiar, pois grande parte são exportados”, enfatizou Herman Oliveira, o representante do Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad), que será um dos coordenadores do painel sobre o tema “Agroecologia e Saúde Socioambiental : ZSEE em perspectiva“.
O encontro sobre a democratização do uso do solo em Mato Grosso será no dia 6 de outubro, quarta-feira, a partir das 18h.
Herman Oliveira relembra que a agroecologia é um debate político e não apenas uma prática agrícola. “A agroecologia diferente dos orgânicos, não é só uma prática, exclusivamente voltada para o campo agrícola, e sim uma discussão política, comportamental e de cuidados com o meio ambiente”.
O uso dos agrotóxicos, a grave crise hídrica, saúde, o sindicalismo no campo e a agricultura familiar estão entre os assuntos que também serão abordados na programação do evento. “Mato Grosso ainda não incorpora as discussões sobre agroecologia numa proposta de sustentabilidade, principalmente nas questões sobre crise climática e hídrica. Situações em grande escala que prejudicam toda a população, inclusive, o modelo de agricultura que hoje domina o estado”, conclui.
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) a fome é um dos grandes desafios da próxima década. Um levantamento da instituição de 2021 revelou que uma em cada oito pessoas está subnutrida no mundo. Cerca de 2,3 bilhões de pessoas, 30% da população mundial, têm restrições nutricionais. As mulheres e crianças são as principais vítimas. Mais de 149 milhões de crianças menores de 5 anos vivem com desnutrição crônica.
No Brasil e em Mato Grosso, campeões de rebanho bovino e produção de grãos, a fome ganha escalas inaceitáveis. Em um estado com 30 milhões de cabeças de gado segundo o IBGE – dez por habitantes, grande parte da população passa fome, não tem o que comer. Recentemente, reportagens nacionais mostraram centenas de mato-grossenses na fila de restos de ossos.
O problema não é falta de produção e sim o sistema que precisa ser modificado. Estima-se que 1% das fazendas ocupam pelo menos 70% das terras agrícolas globais. Estas canalizam alimentos para cadeias globais de suprimento voltadas para exportação. Isso gera a destruição da auto suficiência alimentar doméstica no Brasil e em Mato Grosso. Com o aumento contínuo da produção voltada para a exportação, muitas comunidades também acabam expulsas das próprias terras.
O atual sistema também arrasa florestas, reduz as chuvas e é uma bomba armada para as mudanças climáticas. Cerca de 80% de tudo que foi desmatado na Amazônia foi para o gado e as lavouras, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. (INPE).
De acordo com os cientistas do painel intergovernamental de mudanças climáticas da Organização das Nações Unidas (IPCC/ONU), a agropecuária responde por um terço das emissões de gases que aquecem o planeta e provocam as mudanças climáticas. Com o planeta mais quente, temos menos chuvas. A atual crise hídrica no Pantanal já é um reflexo desse problema.
OUTRO CAMINHO
A agroecologia tem como base os processos da natureza, com o plantio de diversas espécies combinadas na mesma área. Algo que vai além da produção orgânica e de abolir o uso de insumos químicos e veneno. Esse sistema considera ainda o impacto social e ambiental da produção.
O manejo agroecológico aumenta a disponibilidade de nutrientes no solo, se tornando um sistema de produção mais sustentável e mais saudável, e é uma alternativa ao modelo convencional de agricultura difundido em Mato Grosso, com alto uso de agrotóxicos e baseado na compra de insumos, que provoca rápido esgotamento do solo. A transição para esse novo modelo é o foco do encontro. Inscrições para as mesas: https://eva.faespe.org.br/sagro/