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68 ANOS

Rondonópolis revolucionou o jeito de fazer política, diz Bezerra

Ex-governador, ex-senador e prefeito por duas vezes, Carlos Bezerra hoje exerce o mandato de deputado federal e diz que a cidade é um exemplo para o país

Por Eduardo Ramos
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Imagem: temer bezera dilma Rondonópolis revolucionou o jeito de fazer política, diz Bezerra
Carlos Bezerra entre os ex-presidentes Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT)

O deputado federal Carlos Bezerra (MDB) nasceu em Chapada dos Guimarães e visitou Rondonópolis pela primeira vez na década de 60, como caixeiro-viajante. Voltou depois como um jovem advogado e disposto a se fixar no município. Na época queria apenas ‘ganhar o pão de cada dia’ e fugir da perseguição da Ditadura Militar. Nem imaginava que iria construir aqui uma das histórias mais bem sucedidas da política estadual.

Bezerra foi deputado estadual, prefeito por duas vezes, governador, senador e deputado federal por vários mandatos. Também presidiu o INSS, foi o autor da emenda constitucional que garantiu direitos aos trabalhadores domésticos e é uma das maiores lideranças do Movimento Democrático Brasileiro – partido que ajudou a consolidar e por onde conquistou todos os seus mandatos.

Aos 80 anos Bezerra nos contou com riqueza de detalhes como foi essa trajetória e disse se orgulhar de ter feito uma verdadeira ‘revolução’ na política local.  Não é exagero. Ele estreou um novo jeito de administrar e abriu caminho para lideranças como Rogério Salles, Percival Muniz, o atual prefeito José Carlos do Pátio, e também gente mais nova como o vereador Adonias Fernandes e o deputado estadual Thiago Silva.

A entrevista de Bezerra é a mais longa dessa série. Mas merece ser lida com atenção. É um exemplo de amor à política que vale como uma aula para quem deseja saber mais da história de Rondonópolis.

Como foi o seu primeiro contato com Rondonópolis? Que memórias guarda desta época?
Meu primeiro contato com Rondonópolis foi como caixeiro viajante. Eu era representante de várias firmas e estive no município como vendedor. Aí conheci muita gente do comércio, principalmente os atacadistas mais fortes da cidade. Foi quando travei meu primeiro conhecimento.
Depois fui estimulado a ficar aqui pelos mesmos comerciantes, devido a carência de advogados. Eu era estudante ainda, mas no terceiro ano do curso de Direito era possível abrir escritório e assinar como advogado solicitador. Abri o escritório de advocacia junto com meu professor, Renato Pimenta, em 1967. Assim começou meu primeiro contato com a cidade de Rondonópolis.

Quem eram as principais lideranças políticas naquele momento? Elas o influenciaram de alguma forma?
Meu pensamento político sempre foi outro. Mas tinha pessoas muito respeitadas. Eu me lembro de um líder, o Daniel Moura, que era do PSD e muito bem quisto no município. Era um homem íntegro, muito correto e tinha uma liderança muito forte. Também os irmãos Vilas Boas, que lideravam a oposição ao Daniel Moura, pela UDN (União Democrática Nacional). Eram as principais lideranças.

O MDB ainda não existia naquela época. Começou depois, com um grupo formado pelo Conrado Sales de Brito, que tinha uma farmácia, o Alberto Sadi, o Dr. Juarez Pinto, Dário Matos, Ademar Costa [irmão do Áureo Costa]. Eles eram simpatizantes do MDB e fundaram o primeiro núcleo do partido aqui.

Como o senhor decidiu entrar para a política?
Fui para Rondonópolis para ganhar minha sobrevivência e fugir da política. Eu era muito perseguido pela Ditadura e em Cuiabá ficava muito visível. Fui para Rondonópolis para ganhar o ‘panis nostrum’ cotidiano, somente para isso. Já era casado e tinha dois filhos.

Mas houve uma pressão muito grande sobre mim por parte daquelas pessoas que citei antes (Conrado, Alberto, Dário). Aquelas pessoas todas.

O senador Bezerra Neto, que era fundador do MDB, tinha sido companheiro meu no PTB e esteve na cidade para lançar um candidato a deputado estadual. O pessoal disse que não tinha nomes e ele perguntou se eu não estava por aqui. Ninguém me conhecia ainda e ele sugeriu que eles lançassem meu nome, que eu seria um bom candidato.

No dia seguinte meu escritório estava cheio com esses companheiros. Alguns nem me conheciam direito e me convidaram para ser candidato a deputado estadual. Eu sorri, expliquei que não tinha condições, que havia chegado a pouco tempo e não podia nem pensar nisso. Até porque se eu colocasse a cara a Ditadura poderia vir para cima de mim.

Eles passaram a ‘morar’ no meu escritório. Iam todos os dias insistindo com o convite. Até que eu fiz um pacto com eles. Disse: vou ser candidato, mas não vou a lugar nenhum. Farei apenas um pronunciamento na rádio Branife, que era a única e ficava no centro da cidade. Expliquei que não tinha um centavo para fazer material gráfico, que não tinha nada. E eles concordaram

Mas o meu primeiro pronunciamento na rádio Branife causou uma repercussão tão grande que um deputado da Arena me denunciou à Ditadura Militar. Pegou meu discurso e levou à chefia do SNI (Serviço Nacional de Informações), que ficava em Campo Grande. Disse que eu era um agitador, comunista e que precisava ser preso. De fato a PF saiu de Cuiabá para me prender em Rondonópolis. Só não me prendeu porque um contínuo da PF em Cuiabá ouviu o rádio passado pelo pessoal do SNI e avisou minha família. Eles ainda brincaram dizendo que ‘não tinha curral, onde é que iriam botar o Bezerra’.

O meu cunhado pegou um avião e veio à Rondonópolis. Eu estava no meu escritório ele chegou de surpresa e me levou ao aeroporto, onde já estavam minha esposa e meus filhos. Eu perguntei o que era e ele me disse que iria me explicar no avião. Já durante o voo ele contou o ocorrido e disse que me levaria para a Bolívia. Eu não aceitei, disse que não iria fugir pois não tinha cometido crime algum. Fizemos um acordo. Descemos na fazenda de um amigo nosso em Chapada dos Guimarães e à noite segui para Cuiabá, onde me refugiei na casa de um primo. Meu cunhado foi para Campo Grande negociar para que eu me apresentasse, sem prisão. Ainda tive de responder a um processo por um bom tempo, mas a candidatura acabou ali.

Mesmo assim tive 2.800 votos. Mato Grosso ainda não era dividido e tive muitos votos também em Campo Grande, em Corumbá, nas cidade polos. Mas a candidatura mal nasceu e foi morta pela brutalidade da Ditadura.

Dos cargos públicos que ocupou qual lhe deu maior satisfação e porquê?
Sem dúvida nenhuma o de prefeito de Rondonópolis, porque eu estava junto com o povo, trabalhando e fizemos uma revolução. Rondonópolis sofreu uma mudança profunda a partir da minha gestão. A partir daquele momento esse grupo que eu liderei veio sempre comandando o município com sucesso, fruto do trabalho que nós fizemos. E até hoje está aí. O Zé do Pátio é oriundo desse grupo. Na eleição anterior a essa os três candidatos eram oriundos do nosso grupo, o Rogério Salles, o Percival Muniz e o Zé do Pátio, que ganhou e foi reeleito.

Imagem: zecarlos bezerra Rondonópolis revolucionou o jeito de fazer política, diz Bezerra
Bezerra abriu caminho para novas lideranças, como o atual prefeito José Carlos do Pátio (SD)

Sem dúvida alguma transformamos a cidade em matéria de infraestrutura, de trabalho social e organização popular. Criamos associações de moradores, núcleos rurais, e as agentes de saúde que apareceram pela primeira vez em Rondonópolis. Foram muitas coisas, apoio aos bairros, aos mais pobres e carentes. O programa de habitação que fizemos, realizávamos mutirão para fazer casa para as pessoas que não tinham onde morar. Tudo isso sem apoio de Caixa Econômica, sem nada. Apenas com o dinheirinho nosso da Prefeitura

Outro projeto importante foi a construção de banheiros. Muita gente fazia a meia-água, mas não tinha condições de fazer o banheiro. As pessoas iam defecar no mato, usavam jornais. Fizemos um programa para construção de banheiros nessas casas. Junto com as associações de moradores nós íamos atendendo as famílias.

Qual a experiência mais marcante neste período?
Foi a questão da Saúde. Rondonópolis só tinha um posto de saúde. O povo fazia filas enormes para ser atendido e às vezes vezes o médico não aparecia. O pessoal ia lá em casa e dizia, ‘Bezerra o pessoal está morrendo na fila e não tem médico para atender’. Eu ia lá e perguntava do médico, diziam que ele não foi trabalhar hoje porque houve um jantar na noite anterior. Eu demitia, contratava outro e após alguns dias acontecia de novo. Eu pensei isso não vai dar certo, esses caras vão me matar.

Até que me lembrei de um livro que eu li na juventude de um jornalista pernambucano que viveu dois anos na China, voltou e escreveu uma obra chamada ‘Nós e a China’. Nela ele falava dos ‘médicos de pés descalços’ que resolveram o problema da Saúde em um país com mais de um bilhão de habitantes. Eram os agentes de Saúde.

Procurei no Brasil quem tivesse mexido com isso. Achei, em Lins (SP), o Instituto Paulista de Promoção Humana (IPPH) que era mantido pela Igreja Católica para dar apoio aos cortadores de cana, os ‘bóia frias’.

O padre Augusto, que dirigia esse instituto, falou comigo e se propôs a vir a Rondonópolis. Nós escolhemos os primeiros 23 bairros e, em cada um, selecionamos três pessoas que sabiam aplicar injeção, que eram parteiras, que tinham algum conhecimento na área da saúde. Elas fizeram um teste na Secretaria de Saúde e as que se saíram melhor foram enviadas para um treinamento com o padre. Treinamos as primeiras 23 (muitas delas estão vivas ainda) e construímos os primeiros 23 postos  em mutirão. A prefeitura entrava com o material e a associação de moradores com o trabalho. E daí mudou completamente o quadro da Saúde em Rondonópolis.

Foi uma revolução e o exemplo de Rondonópolis virou modelo para o país. Passou a vir gente do Rio Grande do Sul, do Ceará, do Brasil inteiro para conhecer aquela experiência nossa, inédita. A participação popular foi fundamental, pois naquela época não existia o SUS, não tinha essa dinheirama que tem hoje. Era só o nosso dinheirinho, os municípios tinha que se virar. E nós nos viramos.

Para mim isso foi muito importante, criamos em Rondonópolis um modelo que ainda hoje é realidade no Brasil Inteiro através do programa Agente de Saúde da Família.

Depois, como governador, construí o Hospital Regional de Rondonópolis, que está aí servindo o povo até hoje.

Imagem: Bezerra thiago lothar Rondonópolis revolucionou o jeito de fazer política, diz Bezerra
Bezerra e Thiago Silva durante visita ao padre Lothar, parceiro em vários mutirões na Vila Operária – Foto: Reprodução

O senhor considera ter conseguido retribuir à cidade o que ela lhe ofereceu? Porquê?
Eu acho que retribuí muito para a cidade. Fui o primeiro candidato a prefeito de Rondonópolis a fazer um Plano de Governo. E executei esse plano completamente, indo além do que havia prometido.

O mais importante é que mudamos a superestrutura da cidade, que até então vinha de uma política atrasada, de compadrio, de empreguismo. A cidade não tinha nem mapa, não tinha cadastro e não dava nem para cobrar imposto. As administrações não se preocupavam com isso. Nós mudamos isso, fizemos um corte.

Rondonópolis passou a fazer política pública de qualidade, como se deve fazer a política, para o bem comum. Essa mudança persiste até hoje. Tem 40 anos e de lá para cá o caminho da cidade foi esse. Não teve mais inversão disso e eu fico feliz por isso.

Consegui dar um rumo que é seguido até hoje. Então considero que eu dei para a cidade muito e isso foi importante pra o futuro de Rondonópolis

O que Rondonópolis representa para você?
Considero Rondonópolis como minha terra natal, está dentro do meu coração. O que esse povo de Rondonópolis me deu como retribuição, os mandatos que eu tive, a participação que eles tiveram junto comigo me deixa com o coração repleto de amor por essa cidade, que hoje é a mais politizada do Estado.

Fico feliz quando vejo os embates em Rondonópolis, que são diferentes de qualquer outro município. São embates ricos, com ideias. A postura da nossa Câmara Municipal, sempre invejável. A postura dos dirigentes municipais sempre diferenciada. Sinto por Rondonópolis um amor muito grande e fico muito feliz em ver como as coisas ocorrem na cidade.

Se pudesse dar um presente hoje ao município e aos rondonopolitanos, qual seria?
Sem dúvida nenhuma eu daria emprego aos milhares de desempregados que estão em Rondonópolis. Sei que a cidade tem recebido muitas empresas e indústrias. Chegou também a ferrovia, que estrategicamente é muito importante. Mas isso não é suficiente para suprir a demanda da cidade. Precisamos investir em qualificação profissional, pois muitas vezes tem o emprego e o cidadão não está preparado para aquela função. Então precisamos qualificar nossos trabalhadores, trazer novas empresas e indústrias, amparar o cada rondonopolitano que hoje está na rua da amargura.

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