É inegável que o Poder Judiciário está hipertrofiado. Guardião da Constituição, o Supremo Tribunal Federal (a quem compete a interpretação final da Carta Magna) realiza trabalho de exegese que sempre conduz à conclusão final: a Corte tem sempre a última palavra. Será?
Desde há muito o STF vem esvaziando (e diminuindo) o alcance das ações dos outros dois poderes da República. Os ministros inovam na ordem jurídica “a torto e a direito”, usurpando competência legislativa que, pela própria Constituição, é mister e apanágio do Poder Legislativo. Tome-se como exemplo a possibilidade de casamento homoafetivo. Sem que uma letra sequer do Código Civil fosse mudada, entenderam os ministros que era legal a união, e que equivaleria ao casamento civil.
Antes que me acusem de preconceito, esclareço que reconheço a medida como justa. Entendo que todos os relacionamentos humanos não ilegais devam ser regrados para proteção das partes envolvidas e que é direito de cada um estabelecer ao lado de quem quer passar a vida ou parte dela. Contudo, não deveria isso ser debatido na instância mais apropriada, o Congresso Nacional? É ali que estão os representantes eleitos do povo brasileiro e, por isso mesmo, mais legítimos para discutir as questões nacionais.
Em outro caso, o STF equiparou a homofobia ao crime de preconceito, mais uma vez sem se mudar uma letra ou um til da lei. De novo, como defesa prévia, afirmo que sou absolutamente contrário a qualquer tipo de discriminação. O ser humano é livre para orientar sua vida sexual como bem lhe aprouver, desde que o ato em si não seja previsto como crime. E, por isso, toda e qualquer orientação sexual deve ser respeitada. Mas a mudança do paradigma jurídico feita pelo Supremo não seria uma usurpação de função do Legislativo?
Agora, como se portarão os ministros da Suprema Corte no caso do perdão presidencial concedido pelo presidente Bolsonaro ao deputado federal Daniel Silveira, uma prerrogativa exclusiva do chefe do Executivo? Seis ações contestam no Supremo a graça a Silveira, e todas foram compiladas para julgamento em um único pedido, cuja relatora será a ministra Rosa Weber. Como prescreve o regimento interno do STF, a ministra já assinou prazo de 10 dias para o Planalto se manifestar sobre as ações. Mas, caberia à Corte imbicar-se em ato exclusivo e discricionário do presidente da República?
Se assim o fizer, o Supremo vai se isolar ainda mais. Já não conta com o apoio do Congresso nesse caso de Daniel Silveira. Os parlamentares agem por corporativismo em casos assim. É como a OTAN, a aliança militar liderada pelos Estados Unidos: mexeu com um, mexeu com todos! Também está sempre em rota de colisão com o Executivo. Que falta? Tem mais, acredite.
No último domingo (24), em evento acadêmico na Alemanha, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que estariam usando o exército para atacar o processo eleitoral no Brasil a fim de desacreditá-lo. Ele não citou o presidente Bolsonaro, mas o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, rebateu a fala de Barroso, taxando-a de “irresponsável” e “ofensa grave”. Legislativo, Executivo, Forças Armadas: de quem mais o STF quer se isolar?
O Supremo se isola porque supõe posição ou função constitucional que não possui. Ele é guardião da Constituição, não tutor da democracia. Em suas ações e julgados, os ministros se esquecem da harmonia que deve haver entre os poderes da República e brincam de Deus, tencionando o quanto podem as relações entre eles. Esquecem-se que a democracia se faz por diálogo, não por imposição.