Por pouco, pacientes que fazem tratamento contínuo de hemodiálise em uma clínica conveniada com a Prefeitura de Rondonópolis não ficaram sem a sessão nesta quarta-feira (11). Eles foram pegos de surpresa com a notícia de que não seriam atendidos por falta de insumos necessários para a realização do procedimento, como o soro fisiológico. A empresa, a clínica Pronefron, alega dificuldades na compra dos materiais e, mais grave, atrasos nos repasses do Ministério da Saúde depositados nas contas da Prefeitura de Rondonópolis. É competência do Município destinar o dinheiro à clínica, o que não ocorre, segundo afirma, desde o mês de abril.
SEGUINDO OS PASSOS
Foi uma tarde longa. A reportagem do portal AGORA MT acompanhou o drama de parte dos pacientes que, sem a previsão de atendimento, foram pedir socorro à promotoria de Justiça. Na porta do Judiciário, um grupo de dez aguardava para ser atendido.
Sivaldo Dias de Almeida tem 62 anos, faz hemodiálise há 20 e era um dos “acampados”. “Nunca tinha acontecido isso, ser paralisado. Mas hoje o proprietário nos disse que não faria. Apenas os pacientes do particular estavam sendo atendidos. Nós, do SUS, não teríamos o atendimento por falta de medicamentos e materiais”, disse.
Nas mãos, ele segurava dois documentos, entregues pela própria clínica. “Estes aqui são os documentos dos repasses feitos pelo Ministério da Saúde (MS), de março e abril. O dinheiro chegou na conta da Prefeitura, mas não foi feito o repasse para a clínica”, argumentou.
O primeiro documento apontava data de referência fevereiro de 2022, no valor de mais de R$ 856 mil pagos em 29/03 pelo MS. O segundo, com referência de março e pago em 12/04, mais de R$ 737 mil destinados à Prefeitura de Rondonópolis.
Os recursos mensais destinados pelo Ministério da Saúde são depositados em uma conta do Fundo Municipal de Saúde, responsável pelo custeio e manutenção dos serviços, incluindo os pagamentos das empresas conveniadas.
Quando perguntado pela reportagem sobre ficar sem o tratamento, a resposta de Sivaldo foi curta. “Pra mim, não fazer a hemodiálise é a mesma coisa que ir pra casa e esperar a morte”.
PROMOTORIA
Pouco antes da chegada da equipe, a comitiva de pacientes foi recebida na promotoria de Justiça. Após alguns instantes, uma assistente da promotora de Justiça Dra. Joana Maria Bortoni Ninis se dirigiu ao grupo -a esta altura na presença da reportagem- dizendo que seriam atendidos na Pronefron ainda nesta quarta-feira.
Segundo o informado, um contato da promotora com uma assistente da Secretaria Municipal de Saúde havia sido feito. A reportagem esperou, mas não foi atendida pela promotora.
FOMOS À CLÍNICA
Acompanhando os pacientes, a equipe foi à Pronefron, a pouco mais de uma quadra de distância (a sede da Promotoria se localiza na Avenida Rio Branco e a clínica na rua Dom Bosco, no Jardim Guanabara). Lá, o clima seguiu exaltado. Um representante da Secretaria Municipal de Saúde deixou o local logo da chegada da equipe. Não se sabe se a visita está ligada ao caso.
A reportagem do portal AGORA MT já havia, porém, solicitado um posicionamento oficial da Secretaria Municipal de Saúde. A Pasta emitiu a seguinte nota:
“A Secretária Municipal de Saúde informa que já notificou oficialmente a Pronefron na tarde desta quarta-feira (11) e que tomou todas as providências cabíveis, inclusive para que a prestadora de serviço seja penalizada por ter fechado as portas nesta mesma data. Segundo a gestora da Saúde, Izalba Albuquerque, não há nenhum pagamento em atraso e nem fora da data, que nos últimos meses, por exemplo, foram feitos nos dias 11/02, 11/03 e 13/04”, diz. E segue: “A Pronefron é uma prestadora de serviço do SUS e assim como todas as outras não podem interromper o atendimento sem notificar a Secretaria Municipal de Saúde com no mínimo 90 dias de prazo e até o momento a pasta não recebeu nenhum comunicado sobre o fechamento”.
PROPRIETÁRIO MANTÉM VERSÃO
A nota da Secretaria Municipal de Saúde contradiz a versão defendida pelo médico e proprietário da Pronefron, dr. Francisco Lima Neto. Ainda durante a presença da equipe do portal na clínica junto aos pacientes, ele chegou, conversou com alguns em tratamento e aceitou gravar uma entrevista.
Em mãos, ele possuía o mesmo documento mostrado antes pelo paciente Sivaldo. Datado, um repasse de referente a março, feito pelo Ministério da Saúde em 18 de abril aos cofres da Prefeitura e não repassados às duas clínicas que prestam este tipo de serviços conveniadas com o Município.
No ano passado, além da alegação de atrasos nos repasses mensais, a Pronefron já havia acusado ausência nos repasse da chamada ‘verba Covid’ -auxilio emergencial para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus estipulada pelo Governo Federal- paga, segundo afirma, em janeiro de 2022. “Um ano e quatro meses de atraso”, acusa.
A clínica Pronefron atende pelo SUS pacientes de Rondonópolis e outros municípios da região, entre Guiratinga, Jaciara, Sonora, Campo Verde e Dom Aquino.
Os pacientes acompanhados pela equipe de reportagem conseguiram realizar a sessão de hemodiálise no final da tarde desta quarta-feira (11). Mas, ainda, segundo o médico Francisco Lima, não por repasse da prefeitura ou telefonema da promotoria de Justiça. “O que eu fiz foi conseguir um dinheiro emprestado com um amigo, que dá para mais seis dias de hemodiálise”, disse.
A entrevista com o médico e proprietário da Pronefron foi registrada em vídeo. Veja abaixo: