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Chefe de pesquisa de vacina no Brasil está em isolamento

Da Redação com BBC Brasil
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Na última sexta-feira (13), o médico Jorge Kalil se dedicava profundamente aos estudos sobre a pandemia do novo coronavírus, no laboratório de imunologia do Instituto do Coração (Incor), do qual é diretor. Ele trabalhava em sua mais recente tarefa: a busca por uma vacina contra o Sars-cov-2, como o vírus é chamado oficialmente.

O imunologista lidera uma equipe composta por cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e do Incor. Há duas semanas, pouco após o primeiro caso diagnosticado no Brasil, os especialistas tentam desenvolver uma forma de imunizar as pessoas contra o Sars-cov-2.

Em meio às pesquisas para a vacina, o médico de 66 anos — os idosos fazem parte do grupo de risco — descobriu que pode ter contraído o novo coronavírus. Nesta segunda-feira (16), o filho dele, de 34 anos, foi diagnosticado com a covid-19, doença causada pelo vírus.
“Ele jantou na minha casa na última terça-feira, quando já estava com o vírus. Por isso, eu e minha esposa estamos em isolamento”, diz a BBC News Brasil. Desde sábado (14), após o filho fazer os exames, Kalil e a esposa estão reclusos.

Nesta segunda, o médico acompanhou à distância os estudos para a elaboração da vacina. Enquanto conversava com a reportagem por telefone, ele estava atento ao avanço da pesquisa, por meio do computador.
“Não preciso estar presente fisicamente. Posso fazer as discussões por teleconferência. Os estudos estão acontecendo normalmente”, pontua o cientista. Kalil foi o único membro da equipe que teve de se isolar por conta do coronavírus.

“Os outros membros estão bem. Desde o princípio, eu tomava os cuidados adequados. Lavava as mãos várias vezes por dia, usava álcool em gel e tentava evitar contatos próximos com as pessoas”, explica. Ele afirma que desde o fim de fevereiro passou a adotar medidas para se proteger do coronavírus.

A vacina

Kalil estuda métodos de imunização há mais de 30 anos. Ex-diretor do Instituto Butantan, ele ajudou, por exemplo, na produção de uma vacina contra a dengue. Recentemente, estava focado nas vacinas contra o Streptococcus pyogenes, que causa a febre reumática e cardiopatia reumática crônica, e em outra contra a chikungunya. As pesquisas são financiadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Quando surgiram os primeiros registros do novo coronavírus no Brasil, ele deixou todas as outras pesquisas para depois. Junto com sua equipe, decidiu se dedicar exclusivamente a uma vacina para tentar combater o Sars-cov-2. A pesquisa também é financiada pela Fapesp.

Os cientistas brasileiros irão sintetizar em laboratório uma parte de uma proteína do coronavírus, importante para penetração na célula.

Por meio do método, os cientistas planejam chegar, nos próximos meses, a uma vacina. Primeiro, ela será testada em camundongos. Caso os testes tragam bons resultados, a expectativa é de que possa ser aplicada em pacientes em até um ano e meio.

A estratégia é diferente da que tem sido adotada por indústrias e cientistas de outros países, que também tentam desenvolver a primeira vacina contra o novo coronavírus — até o início de março havia mais de oito projetos em diferentes países.

Enquanto a vacina dos brasileiros busca recriar uma parte da proteína do vírus, as de outros países recorrem a métodos que envolvem a inserção de moléculas sintéticas de RNA mensageiro (mRNA) — que têm as instruções para a produção de alguma proteína reconhecível pelo sistema imunológico. Nas pesquisas feitas em outros países, o objetivo é que o sistema imunológico reconheça as proteínas artificiais para que elas possam ajudar no combate ao coronavírus.

Já a plataforma usada pelos pesquisadores brasileiros, conforme a Fapesp, é fundamentada no uso de partículas semelhantes a vírus (VLPs, na sigla em inglês de virus like particles) — tal semelhança faz com que sejam facilmente reconhecidas pelas células do sistema imune.

Desta forma, segundo os estudos brasileiros, as VLPs — que não têm material genético do vírus, o que impossibilita a replicação — são introduzidas no sistema imunológico junto com os antígenos (substâncias que fazem com que o sistema imunológico produza anticorpos). Assim, auxiliam na produção de uma resposta imune ao novo coronavírus.

“Neste momento, rsolvemos canalizar os esforços nessa vacina para o novo coronavírus. É algo muito importante agora”, pontua Kalil.

O isolamento

Animado com os avanços da pesquisa para a vacina, Kalil ficou em meio a uma situação inesperada quando descobriu a suspeita de que o filho pudesse ter contraído o coronavírus. “Na quinta-feira, ele começou a se sentir mal. No dia seguinte fez os exames. Na segunda teve o resultado positivo.”
O médico relata que a nora também foi diagnosticada com a covid-19, após apresentar os sintomas — como febre e problemas respiratórios. “Ela contraiu a doença em um clube, porque teve contato com pessoas infectadas e passou para o marido”, diz.

Diante do diagnóstico do filho e da nora, Kalil e a esposa, de 62 anos, decidiram se isolar por 14 dias na residência em que moram. “Não temos nenhum sintoma no momento. Mas como tivemos contato com o nosso filho quando ele já estava infectado, mas ainda sem sintomas, então achamos que o melhor seria nos isolarmos”, afirma. Por não ter sintomas, ele não planeja fazer exames, ao menos por ora.

Ele considera uma situação irônica o fato de ser responsável pelo estudo contra o Sars-cov-2 e estar com a suspeita de ter contraído o vírus. “Mesmo tomando precauções há algumas semanas, como evitar aglomerações e reuniões, isso acabou acontecendo comigo.”

“É um vírus que tem afetado muita gente”, declara. O Ministério da Saúde diz que há 234 casos confirmados no país até segunda-feira (16). “Mas acredito que o número seja muito maior. Só entre pessoas que conheço, aqui em São Paulo, há mais de 100 casos”, declara.

A principal preocupação de Kalil é pelo fato de ele e da mulher serem idosos. Apesar disso, ele afirma estar otimista e acredita que caso tenham contraído o vírus, logo irão se recuperar.

Enquanto vive a incerteza sobre o seu diagnóstico, ele afirma que continuará acompanhando a distância os estudos sobre a vacina.

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