Aprender a ler e escrever foi a grande transformação da vida de Washington José Gomes da Silva, 24 anos, que se encontra recluso na penitenciária regional Major Eldo de Sá, mais conhecida como Mata Grande, localizada em Rondonópolis (212 km ao sul de Cuiabá). “Tudo mudou quando comecei a estudar, há seis meses. Nunca imaginei que pudesse pensar assim, mas saber ler foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Agora sei que terei futuro, quero sair daqui e continuar meus estudos lá fora”, acrescenta.
O desejo de modificar o destino dos recuperandos é incentivado por meio de um projeto de ressocialização, que instalou na unidade prisional o setor de educação, que atende a 292 alunos do regime fechado, da alfabetização à preparação para o Enem.
Sob a coordenação da juíza da 4ª Vara Criminal de Rondonópolis, Tatyana Araújo Borges, o projeto realizado em parceria com a Fundação Nova Chance foi adequado para contemplar os reeducandos de modo a não afetar o cumprimento das penas. “Nossa sistemática de educação formal é diferenciada aqui, pois os alunos estudam por banco de horas. Se o apenado for transferido, não perde o ano como na escola comum, ele pode retomar as aulas em outra unidade penal aproveitando a carga horária que já cursou”, explica a magistrada.
De acordo com a coordenadora do setor de educação, a pedagoga Creuza Rosa Ribeiro, há uma ampla ação para garantir o projeto educacional juntamente com o profissional dentro da Mata Grande. “Nosso objetivo é usar esta ferramenta, de oferta de cursos formais e técnicos, para a inclusão social, preparando-os para o mercado de trabalho”.
Para que os recuperandos concluam o ensino fundamental é necessário ter 1600 horas acumuladas. Enquanto que para finalizar o ensino médio precisam ter 1200 horas. Outro estímulo para eles é a remição de pena, a cada 12 horas estudadas é reduzido um dia da pena.
A oportunidade gera entusiasmo entre os apenados. Paulo Sérgio Pereira Gomes, de 44 anos, que cursa o ensino fundamental, alega que continuar os estudos é uma porta aberta que irá aproveitar. “Foi muito bom voltar a estudar, aprender mais, seguir a vida. Nós erramos e estamos aqui para pagar por isso e estudar representa o respeito com que somos tratados”.
O boliviano Ricardo SanInez, de 34 anos, que está encarcerado há dois anos na Mata Grande, foi outro beneficiado pelo projeto educacional. “Quando cheguei aqui não conseguia sequer me comunicar, não falava e mal entendia a língua portuguesa. Aqui aprendi a ler e escrever em português, hoje estou à vontade com a língua, me comunico muito bem. Inclusive, sou um amante da literatura brasileira, em especial de Jorge Amado”.
Contudo, a grande chance quem recebeu foi Alexandre Silva Machado, de 28 anos, que após fazer o curso preparatório para o Enem, passou no exame e assegurou sua vaga na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), onde cursará Engenharia Ambiental. “Foi na educação que encontrei um caminho para me ressocializar. Valeu a pena me dedicar, vou conseguir meu diploma de nível superior. Quero mostrar a todos, à sociedade e a minha família que posso ser alguém na vida”.
Além de Alexandre, outros quatro recuperandos se tornarão acadêmicos da UFMT, a partir do próximo semestre. Dois deles vão cursar Zootecnia, um Biologia e um Engenharia Mecânica. Entretanto, 72 estudantes da penitenciária já prestaram o exame.
O resultado positivo comprova a dedicação dos professores do setor de educação. Nayhane Ramos, que ministra aulas na área de linguagem, começou a atuar na unidade este ano, mas se diz satisfeita com o trabalho. “É prazeroso trabalhar no presídio. Os alunos são comprometidos e se mostram sempre muito interessados nas aulas. É perceptível que querem usar o que aprendem para tomar outro rumo quando saírem daqui”.
No entanto, a abnegação da professora de Ciências e Matemática, Maria Rosenilda Gonçalves, que há nove anos ensina na penitenciária, se destaca. Embora já tivesse formação em Ciências, ela cursou Matemática apenas para aplicar aulas na unidade prisional. “Para mim foi um desafio trabalhar aqui, onde vi que podia fazer mais que lá fora. Me sinto realizada e faria outro curso se fosse preciso. Nossos estudantes avançaram muito, por isso invisto neles. Estou muito feliz com as excelentes notas que eles têm”.
O setor de educação da Mata Grande é composto por 14 educadores, que ministram aulas em cinco salas, nos períodos matutino e vespertino, na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA).