Inchaço, dor abdominal, mau humor e irritação podem ser sinais de um problema bastante comum e que tem aumentado com a aceleração do ritmo de vida moderno e da alimentação desequilibrada: a constipação crônica. Quem sofre com o problema geralmente se queixa de sintomas como esforço ao evacuar, inchaço, sensação de entupimento e dificuldade de passagem das fezes.
Estima-se que cerca de 20% da população ocidental, na maioria mulheres (apresentam 2,5 vezes mais constipação que os homens) carreguem esse mal. Isso significa que, só no Brasil, mais de 30 milhões de pessoas sofrem com o problema, que é a segunda queixa mais frequente da clínica médica. A constipação é normalmente caracterizada pela pouca evacuação, diminuição do bolo fecal, fezes endurecidas ou número de evacuações inferior a três por semana.
As pessoas que sofrem de constipação relatam grande estresse físico e emocional, uma vez que o problema a impede de desfrutar de atividades diárias. Embora a constipação não seja considerada tão comum como algumas condições crônicas de saúde, o número de pessoas que ela afeta é maior que a de pessoas com asma, diabetes e problemas cardíacos.
Esta pode acompanhar um indivíduo sem tratamento eficaz durante anos. Além de ter vergonha de discutir os sintomas com os médicos, muitos, segundo Flávio Antonio Quilici, professor titular da Faculdade de Medicina da PUC de Campinas, tentam se automedicar e recorrem principalmente a receitas caseiras.
Sinais de constipação aguda podem aparecer de repente e desaparecer depois de alguns dias ou semanas sem causar qualquer tipo de impacto importante na vida de uma pessoa. No entanto, os sintomas da constipação crônica podem durar de três meses a muitos anos e daí sim provocar sérios danos. Estudos recentes mostram que mais de 45% das pessoas com constipação apresentam os sintomas por mais de cinco anos. Dependendo da definição, a constipação crônica afeta até 27% da população de todo o mundo.
Apesar da alta prevalên-cia, há ainda muita desinfor-mação e dúvidas sobre a doença. Tanto que a Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG) tem tido a preocupação de intensificar a divulgação de informações sobre o assunto, que está sendo tema de discussões desde ontem, durante a 11ª Semana Brasileira do Aparelho Digestivo, que termina na sexta-feira, em Fortaleza.
Do evento, organizado em parceria com a Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (Sobed) e Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD), participam mais de 5 mil especialistas para discutir o que há de mais novo no tratamento, prevenção e pesquisa do aparelho digestivo.
“Para nós, a constipação é um grande desafio, porque a abordagem é de paciente para paciente”, diz Flávio Giudici.
“Hoje, 47% dos pacientes com constipação crônica estão insatisfeitos com o tratamento”, diz a professora adjunta da Universidade Federal de Minas Gerais e da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais Maria do Carmo Friche Passos, coordenadora científica do Fundo de Pesquisa e Aperfeiçoamento e do site da Federação Brasileira de Gastroenterologista.
Mas o que acontece se a pessoa não se tratar?
“Além de prejudicar a qualidade de vida, nos últimos anos a constipação aumentou o índice de doença diverticular e de câncer do intestino grosso”, diz José Galvão Alves, presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia.
Intestino não precisa ser um relógio
Todo mundo acha que o intestino precisa ter a precisão de um relógio e funcionar diariamente na mesma hora. Mas cada organismo acerta os ponteiros de acordo com um ritmo próprio, explica Flávio Antonio Quilici, professor titular da Faculdade de Medicina da PUC de Campinas.
Os médicos não costumam confirmar um diagnóstico a partir dos sintomas sem conhecer a frequência de evacuação do paciente. Como ele geralmente está mais preocupado com os sintomas do que com a frequência, há uma dissociação significativa que, muitas vezes, resulta em um diagnóstico tardio.
Segundo Quilici é considerado normal o intestino funcionar de duas vezes ao dia ou até duas ou três vezes por semana. “Cada organismo tem uma característica”, explica. No entanto, é preciso ficar atento e procurar um médico, uma vez que pessoas que sofrem de constipação crônica apresentam maior risco de desenvolver complicações como hemorroida, ruptura anal, obstrução intestinal, oclusão intestinal e úlceras.
É claro que, se o hábito for frequente, vai ser mais difícil ter prisão de ventre. Mas se a pessoa que, por exemplo, vai duas vezes por semana ao banheiro não apresentar fezes endurecidas, sangramento, a barriga não inchar e não houver dor e nenhum outro desconforto, o quadro é normal, diz o médico.
Novo medicamento chega ao Brasil
Um novo tratamento acaba de chegar ao Brasil para tratar mulheres que sofrem com a constipação crônica. A prucaloprida (conhecida comercialmente como Resolor) já é encontrado nas farmácias desde outubro e exige prescrição médica. Trata-se do primeiro de uma nova geração de medicamentos chamados de agonistas do receptor 5-HT4, que ajuda a restituir o funcionamento normal do intestino pela ativação de receptores químicos no sistema digestivo.
“A prucaloprida representa uma ótima opção para o tratamento da constipação crônica em mulheres com sintomas moderados a graves e é considerado um medicamento seguro”, diz Maria do Carmo Friche Passos, professora adjunta da Universidade Federal de Minas Gerais e da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, coordenadora científica do Fundo de Pesquisa e Aperfeiçoamento e do site da Federação Brasileira de Gastroenterologista. Ela acredita que dentro de um ano tenha a liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitárioa (Anvisa) para outros pacientes.
Em estudos controlados com placebo, quase o dobro dos pacientes que tomaram a prucaloprida, nas doses de 2 mg ou 4 mg uma vez ao dia, alcançou a normalização das evacuações em comparação aos que tomaram placebo. A nova droga não só apresentou sinais significativos no aumento do percentual de evacuações mas também aliviou os sintomas da constipação, como inchaço, esforço, dor de estômago e desconforto, além de eficácia sustentada por um período de até dois anos.
O medicamento é produzido pela Janssen Farmacêutica. Em mais de 80 estudos com 3 mil pacientes, o remédio mostrou um bom perfil de segurança e, dos efeitos colaterais mais comuns, dores de cabeça (22%), náusea (17%) e diarreia (11%) foram relatadas apenas no início do tratamento e desapareceram. A caixa com 28 comprimidos custa em torno de R$ 200 e não é distribuída pelo sistema público de saúde.