Chegou às mãos da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Rondonópolis na tarde desta quinta-feira (15) o resultado de uma auditoria pedida pelo órgão municipal à Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT) sobre os repasses do Município à Santa Casa de Rondonópolis. O documento confirma a versão dada à imprensa pela secretária municipal frente à Pasta, Izalba Albuquerque, de que não há dívida do Município com o hospital filantrópico.
A Santa Casa alega que a Prefeitura deixou de repassar pelo menos R$ 12 milhões por serviços prestados ainda em 2020, recursos Covid-19, além de outros R$13,8 milhões por demais serviços prestados entre os meses de julho, agosto e setembro de 2022.
Do primeiro montante, o de R$ 12 milhões, a auditoria foi pedida pela SMS ainda em setembro, pouco depois de o Ministério da Saúde se negar a fazê-la, como adiantou a reportagem do portal AGORA MT. A própria Santa Casa formalizou o pedido junto ao órgão federal.
No dia 18 de agosto, a resposta: uma vez gestora do contrato, a competência de fiscalização dos repasses cabia ao próprio Município. Lembrou, ainda, que tal auditoria já ocorrera por parte da SMS, ainda em junho de 2022.
Já a SES-MT aceitou realizar a auditoria nos repasses. E concluiu: “A alegação da Santa Casa de Misericórdia e Maternidade de Rondonópolis (SCMMR) quanto a retenção do montante de R$ R$ 12.383.400,00 (doze milhões, trezentos e oitenta e três mil e quatrocentos reais) não procede (…). Caso ocorresse o pagamento do faturamento dos leitos de UTI Covid-19 apresentado na produtividade da SCMMR, caracterizaria pagamento em duplicidade”.
Produtividade se refere ao modelo do convênio firmado entre Município e Santa Casa. Os valores são repassados de acordo com os serviços efetivamente prestados. Deste ponto, destaca-se a versão do próprio Município quando a abertura de leitos UTI Covid-19 não utilizados e, portanto, serviços não necessariamente prestados. Por esta razão, não caberia, como afirmara a Prefeitura, o pagamento. Outro ponto importante se deu ainda em 2020: o adiantamento de recursos ao hospital filantrópico por determinação do Ministério da Saúde, na ordem de R$ 16 milhões, para o custeio destes mesmos serviços hospitalares.
O argumento de duplicidade foi defendido pela Secretária de Saúde ainda em 14 de setembro. Izalba, enviou um vídeo à imprensa. À época, ainda afirmava aguardar que Ministério da Saúde auditasse os repasses. “Se o Ministério da Saúde mandar pagar, eu pago”, disse.
O registro foi uma reposta a uma manifestação da direção do hospital filantrópico na Câmara de Vereadores, ação que a chefe da Saúde chamou de “pressão em um momento político”. “Todos os descontos que a SMS fez relacionados aos recursos da Santa Casa foram feitos através de uma comissão de avaliação composta por membros do Estado, da SMS, do Conselho Municipal de Saúde e da própria Santa Casa. Fiz questão de ler todas as atas e em nenhum momento tem questionamentos da Santa Casa sobre esses descontos. Isso me deixa perplexa”, afirmou à época.
Conforme a secretária, os depósitos integrais eram feitos na conta do hospital referentes às diárias de UTI Covid “e depois a santa Casa faturava novamente essas diárias”. Diante disso, “era feito o desconto para que não recebessem duplicidade”, disse à época.
“USO POLÍTICO”
Nesta quinta-feira (15), em posse do relatório da SES-MT, Izalba reafirmou. “Como nós já havíamos afirmado, não devemos nada para a Santa Casa. Agradeço a SES-MT que acolheu a nossa solicitação, pois esse documento comprova que o Município não deve R$12 milhões e, inclusive, fala que se tivéssemos feito o pagamento ocorreria a duplicidade, comprovando tudo o que já havíamos falado. O Ministério Público Federal já havia nos orientado a não fazer o pagamento até o resultado dessa auditoria e ela está aqui hoje”, disse. “Nós pedimos à SES-MT esta auditoria porque a Santa Casa não iria aceitar a alegação do próprio Município. Por isso pedimos um órgão externo. Nós tratamos a Saúde com respeito, diferente dos membros da Santa Casa que tem usado a instituição politicamente (…). Sugiro aos membros que utilizem a instituição de forma assistencial e não política”, disparou.
“CAIXA DE FERRAMENTAS”
O tom de Izalba foi seguido pelo prefeito José Carlos do Pátio. Ar de desabafo nas respostas aos questionamentos da reportagem. E além, o gestor municipal abriu a “caixa de ferramentas” ao defender a mudança do estatuto que rege o filantrópico, hoje sob o modelo de Associação. “Quando é uma Associação, como é agora, se mistura muito o que é público e o que é privado”. Pátio defende a mudança para o modelo de Fundação. “Se tem tanto dinheiro público dentro da Santa Casa já deveria ter se tornado uma Fundação”, criticou.
À imprensa, Pátio e Izalba mostraram um gráfico que compara repasses feitos desde 2016 -último ano da gestão Percival Muniz- ao hospital filantrópico. De lá até 2021, afirmam, o montante subiu em quase R$ 200 milhões, entre recursos federal, estadual e municipal. “A prefeitura em 2021 passou mais de R$ 102 milhões para a Santa Casa, mais ou menos 1,7 mil carros populares, em dinheiro. Nós implantamos UTI Neo Natal, Canguru, Infantil, Coronariana… toda um estrutura para a Santa Casa, mas eles usam toda essa estrutura pública para o fim particular. E o pior: ali tem um cartel de médicos”, atacou. “Hoje ninguém consegue fiscalizar a Santa Casa, é um recurso que entra e ali se dilui. Por causa do nome [Santa Casa, Misericórdia], às vezes, sensibiliza a sociedade, mas ali não é uma entidade pública, nem uma entidade que atende aos interesses da sociedade. É associação, uma entidade privada. Misturam o público com o privado e isso é um absurdo”.
Pátio justificou, ainda, a subida de tom ao rebater o hospital filantrópico. “Depois que aumentamos o tom a sociedade começou a ter outra leitura. No começo eles [Santa Casa] usavam velas, faziam caminhada. Isso sensibilizava. Mas hoje a sociedade já está vendo que a gente respeita o dinheiro público e a Santa Casa não é tudo o que eles pensam, não. Hoje o que acontece é que colocamos dinheiro público e o médico opera pelo particular. Sobre isso, a gente tem que abrir o debate”.
OUTRO LADO
A reportagem procurou a assessoria de imprensa da Santa Casa. Até o fechamento desta reportagem, não houve retorno. O espaço segue em aberto.
O DOCUMENTO
A íntegra do relatório da SES-MT está aqui.